Realidade


O que é real? O que é a verdade?



Espie por detrás da cortina, se tens coragem.

A platéia está ansiosa pelo espetáculo de teatro que não começa. As pessoas estão confortavelmente sentados em suas luxuosas poltronas. O ambiente desse clássico teatro é solene e a Crítica elevou a peça ao mais alto grau da qualidade artística jamais vista. 

Lá do fundo das cadeiras populares, uma espectadora levanta-se e protagoniza uma caminhada lenta, ora segura, ora hesitante, em direção ao palco. Os olhares, no geral, são de reprovação, afinal, por que alguém se levantaria numa hora dessa? A peça não é um "esperando Godot" que é encenada antes mesmo de abrir as cortinas.

Ela aproxima-se do palco, escala-o pela frente, ouvindo agora como explícitas reprimendas o que antes eram apenas murmúrios. Ela aproxima-se cuidadosa e delicadamente da cortina vermelha, pesada. Curiosa, inclina o corpo para a frente, pousa uma das mãos na ponta da cortina e a puxa vagarosamente. Apesar da baixa luz, ela vê, admirada, um vislumbre da realidade como ela é.


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O que é real para mim não precisa ser real para você, pois são ambas diferentes partes/aspectos de uma realidade maior.

O espetáculo de uma peça de teatro tradicional é uma das infinitas formas pela qual a realidade se apresenta a nós. Mas existem inúmeras camadas nesta realidade, e volta e meia, quando alguém fica curioso o suficiente para incomodar-se pessoalmente para espiar atrás da cortina, a questão do que é a realidade torna-se, de novo, atual. Assim foi e assim será.

Esses questionamentos, quando constantes e "profissionalizados" costumam ser integrados à filosofia, principalmente, mas também à religião, artes, psicologia e outros campos. Mas esse questionamento não é exclusividade de nenhum desses campos. Ele é, acima de tudo, humano. 

Assim, nosso questionamento da realidade (aqui temos um pouco mais) visa apoiar uma vida mais significativa, um entendimento melhor de si e dos outros, e melhores conexões, e uma convivência mais harmônica.


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Em teoria dissecamos a Realidade em múltiplos aspectos, na prática ela é indivisível.


No momento em que separamos algo da realidade, e o fazemos a todo o momento, e talvez seja impossível que não o façamos, deixamos de ter O Real e passamos a ter UM real componente do real.


Como não somos capazes de apreender O Real em toda a sua inteireza, embora o vivamos, estamos sempre a apreender alguns aspectos dele, e aqui, como diz Platão, tomamos a "sombra" pela verdade que a projeta.


Encontramos uma inteireza no Real, na Verdade, na Beleza, na Existência, que não encontramos em nenhum outro lugar. E é justamente quando procuramos a ciência, o conhecimento, dessa realidade inteira que a perdemos e entramos na dimensão dos fragmentos, dos aspectos da realidade, da dança infinita das  realidades menores que compõem realidades maiores e vice-versa.


Sim, a ciência dos aspectos da realidade, que estudamos aqui na Escola da Realidade é essencial a uma vida bem vivida. Mas o que aprendemos são sempre complementos a nossa experiência inteira, integral.



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Análise de algumas propostas filosóficas da realidade que tomam "uma parte" do real como se fosse o Verdadeiro Real:



Aperitivo da discussão da realidade feita na filosofia.


Abaixo temos alguns trechos selecionados (estão entre colchetes) do vocábulo 'Realidade' no Dicionário de Filosofia J. Ferrater Mora, acompanhados de comentários iniciais.

  

[a realidade é quantificável]. 

Essa perspectiva traz, em primeiro lugar, o aspecto concreto da realidade, que é normalmente o objeto de nossas mensurações. Mas em segundo lugar, não podemos esquecer, nossas mensurações vem da abstração e das medidas que nela criamos.

 

[realidade é o que é autêntico, verdadeiro, genuíno, natural, não virtual; não ilusório]

Mesmo o que é adulterado, falso, derivado, supernatural, virtual e ilusório, faz parte da realidade. Se não fizesse, a realidade seria uma parte incompleta de algo maior, e assim sucessivamente, até se chegar aquilo que a tudo contém, a realidade última. Assim, do ponto de vista da completude da realidade, ela não pode ser definida negativamente (realidade não é x) porque a própria ideia de não-x existe como negação e faz parte da realidade.


[realidade é atual e não apenas possível]

Uma realidade menor (que é o bloco básico de formação de realidades maiores) é realidade independentemente de sua situação, ou seja, seu estado pode ser atual ou não, pode ser apenas possível, pode ser muito ou pouco provável, ou tão só um estado estipulado. Mas independente da situação em que se encontra, ela não deixa de ser realidade.


[a realidade como ontológico, metafísico, a partir do qual se busca a 'essência' da realidade]

A questão metafísica não nos interessa. A vida real das pessoas reais, eu e você, nos interessa. Assim, toda a metafísica da realidade para nós está contida do fundamento da existência: A realidade é, as coisas são como são, e não há o que não haja. Sugerimos a leitura dessa página para completar a compreensão da realidade.


Os demais fundamentos também são essenciais para se entender a realidade como ela é.


De regra, cada filosofia incorpora alguns aspectos, renega outros, e seleciona um ou outro como central e fundante da realidade. Muitos do movimento racionalista acreditam que a razão, as ideias, são mais reais que a realidade pessoal. Outros discordam, como Kant, que afirma que "o que concorda com as condições materiais da experiência (da sensação) é real". Kant todavia ainda acredita que o conhecimento do real está fora do real. 


[O real em Nicolai Hartmann: 1) o real como oposto ao aparente, 2) a realidade como atualidade:, 3) pode-se confundir realidade como percepção de algo, misturando-se maneira de ser com maneira de conhecer.]

Tanto o tangível quanto o intangível são aspectos do real. Tanto o atual quanto o não atual são modos/aspectos do real. Tanto a percepção de algo, como o algo, são aspectos do real.


No geral, a visão da realidade como permanente (que não aceita a sua variação), coerente (que não aceita as suas diferenças e autonomias), completa (que não aceita o desconhecido, o inesperado, as impossibilidades), absoluta (que não aceita as suas variadas referências e múltiplas relações entre seus componentes), perfeita (que não aceita a sua expansão, renovação, criação) etc. é uma visão idealizada (as ideias são parte, mas não a realidade toda), tenha uma Intenção Divina, como tem nas religiões, tenha uma Intenção Mundana (O Bem, A Ciência, A Razão, A Justiça, A Democracia etc) a ordenar o mundo e propor-se a revelar e explicar a realidade.


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O que não é real também é real.

Sumariamente, tudo existe, e não há o que não haja na realidade. Na pior da hipóteses existe como uma ideia e a negação que a ela se refere (não existe papai Noel, amor desinteressado, justiça, etc, não são reais).


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O fato de que isso é incompatível com aquilo não torna um deles irreal.

A realidade são tanto as ilusões, ambiguidades, incertezas (o jogo), quanto seus fundamentos, seus aspectos (o que é sério, verdade racional e cientificamente comprovável e mensurável), e também aquilo que é verdade apenas para uma única pessoa que seja (é sobre mim).


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O que é abstrato ou subjetivo é tão real quanto o que é concreto.

Mas a realidade é formada tanto pelo que é concreto, abstrato, pessoal e temporal. Tanto pelo que é passado quanto pelo que é presente ou é futuro. 


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O oposto do real é um outro real, todos eles são partes componentes de uma realidade maior.

A realidade é composta tanto do que é imanente quanto do que é transcendente, tanto do que é incluído quanto do que é excluído, tanto do tangível quanto do intangível, tanto das partes quanto do todo, tanto do amplo quanto do restrito, tanto da ordem como das desordens.

As realidades são sempre partes quando formam uma realidade maior, que em si, na imanência, é um todo, mas também é parte de outras realidades maiores. 

A verdade de cada parte, cada realidade menor (naquilo em que compõe uma realidade maior), é coerente em si, mas é incompleta. E a verdade de cada todo, cada realidade maior (naquilo em que é composta por outros realidades menores), é completa, mas muitas vezes incoerente. A realidade ora é coerente e incompleta, ora é completa e incoerente. Assim, somando-se todos seus estados possíveis, a realidade é completa e incompleta, coerente e incoerente.


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As realidades que se contradizem são reais, queira eu acreditar ou não.

As realidades, em constante tensão e choque entre si, podem ser abordadas de diversas maneiras. Quando as vemos de forma restrita, apenas uma parte, a abordamos como se aquela parte fosse a única que existisse. Quando duas pessoas com essa abordagem se encontram, a reação natural é negar a existência da outra, ou a validade de sua visão. 

Num terceiro momento, quando reconhecemos de boa vontade a existência das coisas que não gostamos ou concordamos, abre-se a possibilidade de usar nossa energia e inteligência para diversas formas de convivência entre as diferenças que não seja a busca da eliminação/deslegitimação daquilo que é diferente/contrário a nós. 

Por fim, a realidade é a possibilidade de ver cada uma de suas realidades formadoras como um universo pleno em si, e olhar para o encontro desses universos maravilhados e abertos para a máxima preservação de cada um em cada encontro com outro.

Assim, a realidade é composta: a) de cada uma das realidades que se pretende única (exemplo são os monoteísmos), b) das realidades que se pretendem as verdadeiras em face de outras que consideram falsas, c) das realidades que convivem, de um jeito ou de outro, com realidades que as negam, d) das realidades, dos multiversos, que são cada um em si, plenos, únicos, verdadeiros, valiosos e merecedores de preservação e expansão.


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Não importa o paradigma da realidade que eu adote, todos os paradigmas são reais.

O mundo visto pela técnica é real. O visto pelas ciências é real. Pelas religiões, é real. Pela economia, é real. Pela moral e pela guerra, é real. Pela política, é real. Pela filosofia, é real, Pela arte, é real. E por outros paradigmas de mundo mais populares, tais como o coletivismo, o individualismo etc., também é real.


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O contrário do real, seja da forma que for, também é real, mesmo que não seja atual.

O que simplesmente existe, independente da forma que toma, é real. E cada um dos estados, formas, situações, modos, aspectos que a existência se manifesta, são reais também. O estado atual de algo é real, mas os estados mais remotamente possíveis, talvez apenas imaginados, os estados prováveis, e mesmo os estados que estipulamos em consenso, são todos reais também.


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Uma observação feita é tão real quanto o fragmento observado, concordem elas ou não.

O que é observado é real, e a sua observação é real, embora essa varie conforme as condições de observação, o observador, a perspectiva. Assim, por mais diversas que sejam as representações que se fazem a partir das observações que se fazem a partir das realidades que se observam... são todas reais.


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As necessidades são reais, os problemas, a ação e os impactos que decorrem também.

Por fim, nossas necessidades são reais, assim como os problemas que nascem da sua insatisfação, e a ação que nasce dos problemas (buscando resolvê-los), e os impactos que nascem de todos esses aspectos.


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Aqui você encontra a lista de todos os aspectos da teoria e pode usá-la para navegar por eles.


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